OS DONOS DA NOITE
por Jacques Vallée


(We Own the Night). 2007. Columbia Pictures/2929 Productions/Industry Entertainment (117 minutos). Produção: Nick Wechsler, Marc Butan, Mark Wahlberg, Joaquin Phoenix. Produção executiva: Todd Wagner, Mark Cuban, Anthony Katagas. Co-produção: Couper Samuelson, Mike Upton. Roteiro: James Gray. Fotografia: Joaquín Baca-Asay (Technicolor). Música: Wojciech Kilar. Cenografia: Ford Wheeler (p.d.), James Feng (a.d.), Catherine Davis (s.d.). Montagem: John Axelrad. Elenco: Joaquin Phoenix (Bobby Green), Mark Wahlberg (Joseph Grusinsky), Eva Mendes (Amada Juarez), Robert Duvall (Burt Grusinsky), Antoni Corone (Michael Solo), Moni Moshonov (Marat Buzhayev), Oleg Taktarov (Pavel Lubyarsky), Alex Veadov (Vadim Nezhinski), Danny Hoch (Jumbo Falsetti), Tony Musante (Jack Shapiro), Dominic Colon (Freddie), Katie Condidorio (Hazel), Miriam Cruz (a mãe de Amada), Matthew Djentchouraen (o filho de Eli & Masha), Paul Herman (Spiro Giavannis), Maggie Kiley (Sandra Grusinsky), Robert Kirk (sargento Provenzano), Ed Koch (prefeito), Claudia Lopez (Claudia), Katya Savina (a filha de Eli & Masha), Luigi Scorcia (Luigi), Ed Shkolnikov (Eli Mirichenko), Elena Solovey (Kalina Buzhayev), Craig Walker (Russell De Keifer).

Em meio à guerra entre o Departamento de Polícia de Nova York e a máfia russa nos anos 80, um gerente de boate noturna é convocado pelo pai e irmão policiais a escolher seu lado.

É difícil discorrer sobre um filme cuja forma é tão límpida. O que espanta de verdade em Os Donos da Noite é a mestria total do realizador, a ausência completa de incerteza da mise en scène. Esse controle não tem nada a ver com qualquer vaidade formalista à Kubrick, pois ela está inteiramente a serviço da narrativa. James Gray é, em realidade, com os gênios da Pixar, o melhor contador de histórias do cinema contemporâneo. Desde os primeiros planos, ele agarra o espectador para não mais o soltar até o desfecho, alternando com uma mesma intensidade conflitos familiares sob alta tensão e seqüências de ação deslumbrantes. Viu-se, durante a década passada, suspense mais palpitante que a passagem no laboratório clandestino? Não que eu conheça.

Qual é então, além de sua notável habilidade, o segredo de James Gray? Talvez seja a fé no que ele conta o que o distingue de seus colegas. Certo, como todos os jovens cineastas de hoje, James Gray é antes de tudo um cinéfilo envolto em referências (essencialmente Visconti e Coppola no que lhe concerne). No entanto, diferente de um Tarantino, ele não considera a história do cinema como um parque de diversões, mas como uma reserva de ensinamentos que podem servir a seus projetos pessoais. Graças aos filmes de Visconti ele compreendeu, por exemplo, que a representação de rituais era um meio eficaz e com freqüência fascinante de condensar o que se trama no seio de uma comunidade. Mas isso não significa que ele vá se divertir tocando a música de O Leopardo por cima das imagens da Nova York dos anos 80 (o que faria um Tarantino para mostrar ao mundo inteiro o quanto ele ama Visconti). É que Gray cresceu nessa Nova York dos anos 80, ele foi aos clubes que mostra. A trilha sonora com canções de Blondie, de David Bowie e do Clash não está lá para soar cool, mas simplesmente porque era a música que tocava nesses ambientes naquela época. Em suma, a reconstituição histórica (a Nova York dos anos 80 era muito diferente da Nova York pós-Giuliani) permite ao autor ancorar sua tragédia num ambiente por ele conhecido intimamente. São raríssimos hoje os filmes de gênero filmados com tal ausência de distância, com tamanha veracidade. Isso permite a James Gray dar uma consistência profunda ao tratamento de temáticas eternas tais como a lei, a ordem, a família, a vontade individual, o destino. Essa mise en scène calculada de A a Z que recusa o humor, a digressão e a ruptura de tom poderia rapidamente se tornar asfixiante por excesso de solenidade, mas ela convém perfeitamente a um polar que se quer, e que é, trágico. Ademais, esses são talvez os limites do cinema de Gray. Pode esse metteur en scène ter sucesso com outra coisa além de tragédias? O fracasso relativo de Amantes onde pela primeira vez ele saiu do polar mostra que, no momento, o diretor permanece mais à vontade com um roteiro implacável.

Um comentário, para concluir, sobre a polêmica ridícula que agitou os grupos da cinefilia francesa à época de lançamento do filme. Os Donos da Noite se viu taxado de reacionário, anátema final para certos críticos que nada amam tanto quanto rebaixar os comissários de polícia como medíocres. Pense nisso! Um filme onde o herói se une à polícia ao invés dos traficantes de drogas! Não parece “ideologicamente duvidoso”? É de se perguntar se essa brava gente sabe se servir dos seus olhos. Terão visto a abertura em que a suntuosa Eva Mendes se masturba ao som de Heart of Glass? Quero dizer: como um cineasta pode filmar uma cena dessas com tal apreço ao mesmo tempo em que estaria condenando sem apelo a festa e a depravação?

(Traduzido por Matheus Cartaxo Domingues)


 

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