A DIREÇÃO COMO LUTA DE BOXE – ENTREVISTA COM SERGIO SOLLIMA
por Fabio Zanello


Às vezes a análise de um cineasta parte dos atores. Umberto Orsini, que atuou para Sergio Sollima em Cidade violenta, recorda assim a experiência: “Quando me escalaram, todos nós tínhamos muito medo de Charles Bronson, porque ele é um tipo difícil. No filme eu era o advogado que lhe rouba a mulher. A cena do elevador foi filmada em duas tomadas. A primeira foi em um set na Cinecittà com uma cabine imóvel e um fundo azul. Era praticamente uma jaula que não existia no hotel em Nova Orleans. A segunda era uma externa, em Nova Orleans, sem mim. Eu estava dentro do elevador de vidro imóvel que fingia mover-se. Eu era atingido por projéteis que vinham do lado de fora. Era uma coisa genial. Havia uma carabina carregada com pílulas de glicerina para constipação, que ao atingir o vidro parecia quebrá-lo. O tiro que atingia o meu corpo estava ligado à relojoaria, de modo que PUM o vidro se trincava. Com a montagem e todo o resto, chegou-se a uma cena extraordinária.” Cidade violenta é também o primeiro noir dirigido por Sollima (nascido em Roma em 17 de abril de 1921) após o grande sucesso da trilogia western com Tomas Milian: O dia da desforra, Quando os brutos se defrontam e Corre homem, corre. No entanto, antes de se tornar um dos quatro magníficos Sergios do spaghetti western (os outros são Leone, Corbucci e Bonelli), ele foi um prolífico roteirista de cinema (Tripoli, bel suol d’amore, Ferruccio Cerio, 1954; Ursus, o gladiador [Ursus gladiatore ribelle, Domenico Paolella, 1962]) e de teatro (L’uomo e il fucile, Apocalisse a Capri), para depois estrear no cinema com um episódio de Amores eróticos, realizado a seis mãos com Luciano Lucignani e Alberto Bonucci. Segue uma trilogia de espionagem, onde para os dois primeiros capítulos o diretor usa o pseudônimo de Simon Sterling: Alta espionagem, Agente especial 3S3 e Perseguição a sangue-frio. Os dois primeiros são interpretados pelo torinense Giorgio Ardisson, enquanto no terceiro temos a estrela Stewart Granger. O excelente resultado dessas obras e dos westerns permitem que ele empreenda projetos cada vez mais estimulantes. Assim, após o já mencionado Cidade violenta, realiza o malogrado thriller psicológico O cérebro do mal. E depois de outro policial sombrio como Os raptores em ação, com a inspirada dupla Oliver Reed-Fabio Testi, torna ao centro das atenções com o lendário Sandokan, produzido pela R.A.I., com Kabir Bedi, Philippe Leroy, Carole André e Adolfo Celi, que inaugura suas adaptações de Emilio Salgari. Nos cinemas, O corsário negro e Sandokan, o tigre da Malásia não igualam o sucesso anterior da associação Bedi-Sollima. O cineasta se restabelece então na televisão com I ragazzi di celluloide, uma série autobiográfica com Massimo Ranieri, Alfredo Pea, Roberta Paladini e William Berger. E também é destinado à tela doméstica Il figlio di Sandokan, que permaneceu praticamente bloqueado devido a problemas legais.

Como diria George Lucas, um diretor tem uma luta de boxe por dia, mas todos os dias com um adversário diferente.
— Sergio Sollima




SENTIERI SELVAGGI: A filmografia de Sergio Sollima é geralmente considerada de gênero. Mas o que é o cinema de gênero para você?

SERGIO SOLLIMA: Em 1947 escrevi Il cinema in U.S.A., ocupando-me propriamente dos gêneros. Pense bem nisso. Todos os filmes se enquadram em um gênero. É uma polêmica inventada por jornalistas por conveniência. A palavra gênero é usada para definir autores. Por exemplo, Charles Chaplin fez filmes cômicos. Veja como poucos autores estão fora do gênero! Você já se deu conta? Se você quiser transmitir a mensagem, você certamente não deve programá-la teoricamente.

SENTIERI SELVAGGI: Os gêneros, todavia, formaram você. Como nasceu a vocação para a direção?

SERGIO SOLLIMA: Eu estou em competição com os maiores espectadores do mundo. Venho de uma vida desordenada. A família Sollima era antiguíssima, de origem árabe-siciliano-normanda. Você já ouviu falar de Solimão, o Magnífico? Eu acho que os meus ancestrais fizeram as Cruzadas. Eu tinha um pai muito gentil e uma mãe de caráter forte.

SENTIERI SELVAGGI: Que tipo de espectador você era?

SERGIO SOLLIMA: Um dos primeiros choques culturais que tive, na realidade, não veio do cinema americano, mas do fascismo. O cinema americano à época não existia como o entendemos hoje. Eu vi muitos westerns no cinema paroquial em tempos pré-históricos. Na idade adulta, a inspiração partiu de escritores como Dickens, Thackeray, Jerome K. Jerome e Joyce.

SENTIERI SELVAGGI: E para Amores eróticos, a tua estréia na direção foi extraída da literatura.

SERGIO SOLLIMA: Foi a estreia de Claudia Mori, a beleza mediterrânea que envolvia Enrico Maria Salerno. Essa coisa nasceu de um grupo de amigos como Alberto Bonucci e Luciano Lucignani. Construímos episódios, baseando-nos em romances de autores italianos. Aquele em que Manfredi era soldado era adaptado de Calvino. O meu era adaptado de um conto de Ercole Patti sobre mulheres cheias de um erotismo gracioso e sutil.

SENTIERI SELVAGGI: Mas antes da direção qual foi exatamente o seu aprendizado?

SERGIO SOLLIMA: Eu frequentei o Centro sperimentale em 1941. Luigi Chiarini era o seu diretor. Eu era o mais novo e havia os mais velhos como Michelangelo Antonioni, Giuseppe De Santis, Leopoldo Trieste, Luchino Visconti. Imagine que, inicialmente, Visconti não fora aceito no Centro. Depois trabalhei como assistente de direção tanto para Franco Rossi em Turim no seu segundo filme, uma comédia com Paolo Panelli (Solo per te Lucia, 1952), como para Sergio Corbucci em Terra straniera (1954). Corbucci era realmente um sujeito agradável. Minha estréia como argumentista foi com Janelas fechadas (Persiane chiuse, Luigi Comencini, 1951), onde havia outros iniciantes. Eu colaborei com Franco Solinas, enquanto o roteiro era de Federico Fellini e Tullio Pinelli e a direção, inicialmente confiada a Gianni Puccini, uma pessoa frágil, passou a Comencini. Tive uma urgência criativa porque estava entediado com o cinema escapista à Mario Mattoli. Até Maria Pia Cohen, minha falecida esposa, era uma roteirista.

SENTIERI SELVAGGI: Mas a sua verdadeira escola foi o teatro, certo?

SERGIO SOLLIMA: Mas é claro! Em 1948 escrevi uma comédia: L’uomo e il fucile. Um jovem Nino Manfredi teve que aprender russo no lugar de Ignazio Bosich. Ele falou russo mesmo quando apresentamos a peça em Praga, onde ele ganhou o primeiro prêmio. Havia metade do teatro italiano lá: Rossella Falk, Tino Buazzelli, Arnoldo Foà, Luciano Salce e o já mencionado Sergio Sollima, com a direção de Luigi Squarzina. Falava sobre um grupo de partidários que entravam em ação para o serviço de espionagem americano. Fiz outras quatro comédias. Depois trabalhei com Marcello Ciorciolini em I pallinisti, uma sátira sobre os vícios da sociedade. Nós a encenamos primeiro no Piccolo de Milão, depois no teatro Arlecchino que hoje se chama Flaiano. No teatro dos Satiri, fiz durante três meses Apocalisse a Capri, uma farsa moderna com a debutante Delia Scala e Mario Scaccia. Fora montada em um estilo muito americano, próximo a Arsenic and Old Lace, devo confessar. Corrado Alvaro escreveu um elogio no Espresso e todos passaram a falar bem. Il destino si chiama A foi outra comédia minha representada em Gênova, que desencadeou uma tentativa de motim, com linchamento, porque era demasiado à frente de seu tempo. Como diretor realizei um espetáculo de striptease em Roma no teatro dos Satiri. Depois vieram muitos roteiros, incluindo Il piatto piange e Tripoli, bel suol d’amore. Ferruccio Cerio, um ultrafascista de bela retórica nacionalista, chamou-me para a revisão deste último.

SENTIERI SELVAGGI: E então chegamos aos dois primeiros filmes de espionagem: Alta espionagem e Agente especial 3S3.

SERGIO SOLLIMA: Os filmes de ação sempre me agradaram. Propus à Filmar, de Peppino Maggi, o argumento de Alta espionagem antes mesmo de James Bond. O agente era aquele de Perseguição a sangue-frio. O herói era um verdadeiro filho da puta, assim como James Bond. Alta espionagem custou menos de um milhão, arrecadando mais de cem milhões na bilheteria. As locações de Alta espionagem foram Espanha, Roma, Beirute e Viena, enquanto Agente especial 3S3 filmei em Berlim e Ibiza.




SENTIERI SELVAGGI: O pseudônimo Simon Sterling tem uma origem particular?

SERGIO SOLLIMA: Não. Simplesmente nasceu da imbecilidade italiana que recorria aos sobrenomes da língua inglesa para vender nossos produtos no exterior. Um apelido qualquer baseado nas minhas iniciais.

SENTIERI SELVAGGI: Como você chegou a Giorgio Ardisson?

SERGIO SOLLIMA: Escolhi Ardisson pela sua cara de americano. Claro que eu nunca o teria colocado para fazer Ricardo III! Imagine que este foi o primeiro filme italiano em que havia o karatê. Arte marcial que pratiquei com frequência, e que tive dificuldade em ensiná-lo.

SENTIERI SELVAGGI: E Perseguição a sangue-frio?

SERGIO SOLLIMA: Era um argumento pronto, mas eu propus outro para a P.E.A. Stewart Granger não se encaixava muito na história, porque é um grande ator, mas de filmes de época. Granger na época era o que Russell Crowe é hoje e com ele não me dei muito bem. Sua esposa, Jean Simmons, acabara de divorciar-se dele. Então, ele foi desagradável com seus colegas, embora fosse um profissional impecável. O vilão interpretado por Peter van Eyck, por outro lado, era uma personagem com uma homossexualidade latente.




SENTIERI SELVAGGI: Sua filmografia pode ser dividida em fases. Depois da trilogia de espionagem, seguiram as trilogias western e salgariana.

SERGIO SOLLIMA: Pode ser. Mas gostaria de salientar que a minha fase western começou quando fui apresentado por Sergio Leone ao produtor Alberto Grimaldi. O argumento de O dia da desforra já estava pronto. Grimaldi ficou entusiasmado, e assim ele tentou contatar James Coburn, sem êxito. Na época dos westerns, os espanhóis foram os primeiros a fazer esse tipo de filme! A propósito dos hispânicos, eu já conhecia o Tomas Milian! Ele era cubano, um verdadeiro latino. O argumento havia agradado Grimaldi, o roteirista Franco Solinas já havia trabalhado nele anteriormente. O primeiro título de O dia da desforra era Il falco e la preda (“O falcão e a presa”). Um enredo centrado em um xerife americano e um velho mexicano. Mais tarde, propus um homem maduro como representante da lei, também vencedor nato, e um jovem subproletário mexicano. Volontè foi a escolha inicial para o mexicano, e depois havia Van Cleef ainda sob contrato com Grimaldi. Quanto a Tomas Milian, no entanto, havia muita hesitação, porque vinha do cinema de arte.

SENTIERI SELVAGGI: Então você inventou Milian no cinema comercial. Mas como nasceu o apelido Cuchillo?

SERGIO SOLLIMA: Eu inventei isso. Era um dos membros da gangue em Por uns dólares a mais (Per qualche dollaro in più/For a Few Dollars More, Sergio Leone, 1965). A única personagem com uma faca, talvez porque fosse trágico e irônico.

SENTIERI SELVAGGI: Eles também cortaram algumas cenas no videocassete de Quando os brutos se defrontam com a faca?

SERGIO SOLLIMA: Eles cortaram o duelo falso entre Volontè e Milian.

SENTIERI SELVAGGI: Falemos de características. Na sua trilogia western há também o seu ator-fetiche Nello Pazzafini, enquanto em Corre homem, corre temos John Ireland e em Sandokan, o tigre da Malásia atua Sal Borgese.

SERGIO SOLLIMA: Pazzafini conhecia a língua inglesa da Curva Sud do San Siro! Aliás, os dubladores ingleses tinham facilidade para dublá-lo, porque ele interpretava bem por instinto! Eu me dei bem com John Ireland, realmente extraordinário, pensei “faremos mais filmes!” E então para Corre homem, corre encontrei Donal O’Brien. Não me lembro se era australiano ou canadense. Para Salvatore Borgese, na Índia, os indígenas falavam em indiano!




SENTIERI SELVAGGI: Onde você filmou O dia da desforra e Quando os brutos se defrontam?

SERGIO SOLLIMA: O primeiro em Granada e na Almería. O segundo na Almería.

SENTIERI SELVAGGI: Ennio Morricone foi uma escolha obrigatória?

SERGIO SOLLIMA: Morricone foi a primeira escolha! Nós trabalhamos constantemente enquanto eu tentava fazer uma música diferente daquela de Leone. Para Corre homem, corre ele teve a sua trilha sonora assinada por Bruno Nicolai.

SENTIERI SELVAGGI: Em Quando os brutos se defrontam é enfatizada uma troca violenta entre duas personagens que demolem todas as certezas.

SERGIO SOLLIMA: Mas sabe, em todos os meus filmes eu conto como as pessoas podem mudar suas vidas. Isto nasceu da minha participação na Resistência. Especialmente daquele 8 de setembro: eu estava junto com Visconti, De Santis e Milla.

SENTIERI SELVAGGI: Você foi influenciado pelos quadrinhos de Bonelli para os westerns como outros colegas seus?

SERGIO SOLLIMA: Não, os fumetti não me influenciaram. Apenas os filmes americanos e também os filmes japoneses.

SENTIERI SELVAGGI: Nos teus westerns os planos gerais têm mais importância que os closes.

SERGIO SOLLIMA: Talvez porque todos os meus filmes tenham uma leitura dupla. Eu amo o western. Quando fiz Sandokan, todo mundo me recomendou a fazer apenas close-ups. Se você trabalha muito nos planos abertos aquilo que está ao redor das personagens, no western, acaba sendo destacado.




SENTIERI SELVAGGI: Os dispositivos de montagem também podem ser vistos em Cidade violenta. Nos créditos de abertura, há uma estranha varredura de stills pelo visor da câmera que enquadra Charles Bronson e Jill Ireland.

SERGIO SOLLIMA: É uma motivação realista a do visor. O argumento me foi proposto por Arrigo Colombo e Giorgio Papi e seguia o modelo de À queima-roupa (Point Blank, John Boorman, 1967). Com Lina Wertmüller delineamos uma história desequilibrada, o que à época era uma blasfêmia. A sequência inicial de perseguição com Bronson, em São Tomás, nas Ilhas Virgens, correspondia para nós àquela de Bullitt (Peter Yates, 1968). Rémy Julienne e eu tivemos que lutar tanto pelos becos quanto pelos noventa degraus pelos quais o carro tinha que subir. Você sabe que, para cenas como essa, os americanos têm oitenta pessoas: nós éramos oito! E também tivemos que acelerar!

SENTIERI SELVAGGI: Bronson parece um assassino do código zen.

SERGIO SOLLIMA: Bronson é a vítima real, enquanto Jill é inescrupulosa. A música de Morricone era mais moderna e lírica.

SENTIERI SELVAGGI: A sequência sem som com a câmera lenta no elevador panorâmico, onde Umberto Orsini e Jill Ireland morrem, é celebrada com justiça. Como você a realizou?

SERGIO SOLLIMA: Os ambientes eram distintos na realidade. Bronson atira de um telhado em Nova Orleans, enquanto o elevador era em São Francisco. Nós também filmamos isso na Cinecittà com um fundo azul. No projeto do roteiro, havia a música que Ennio havia composto particularmente para a cena, mas eu me opus porque queria o silêncio! O único ruído devia ser aquele surdo do silenciador de Bronson e o vidro lascado.




SENTIERI SELVAGGI: Charles Bronson tem a reputação de ser um tipo muito duro.

SERGIO SOLLIMA: Ele era muito complexado. Trabalhava como minerador para poder ajustar as cifras e foder no bordel. Ele me disse que se meteu em apuros uma vez porque os preços haviam aumentado. Dizia-me sempre “Você poderia ser meu pai.” Ele era profissional, mas se zangava com os pequenos. Quando a cena terminava e ele estava livre, não fazia nada além de esperar pela refeição. Além disso, ele tinha tabus sexuais.

SENTIERI SELVAGGI: O casal Bronson-Ireland não estava previsto inicialmente, verdade?

SERGIO SOLLIMA: Marina Cicogna preferia Tony Musante e Florinda Bolkan.

SENTIERI SELVAGGI: E a cena com a aranha na cela?

SERGIO SOLLIMA: Bronson se mostrou contrário a mim. A viúva-negra foi feita por Carlo Rambaldi. Havia algumas cordas mascaradas, com a marionete que era muito bem feita.

SENTIERI SELVAGGI: Outra sequência espetacular é a da corrida de carros.

SERGIO SOLLIMA: Para a corrida de automobilismo filmamos quilômetros de filme em Michigan. Naquela ocasião conheci Bruce McLaren. Adicionamos sorrateiramente, all’italiana, algumas imagens filmadas em outras locações. A colina onde Bronson fica de tocaia é em Vallelunga.

SENTIERI SELVAGGI: Permanecendo no noir, em Os raptores em ação há a osmose entre diferentes personagens como na escola francesa do polar?

SERGIO SOLLIMA: Além disso, Oliver Reed é forçado a matar um amigo para conseguir recuperar sua esposa. Eu estava interessado em representar as pessoas diante de circunstâncias imprevistas. Testi é um tipo anarquista, um malandro. No entanto, experimentei esse período de contestação entre a América, Paris e Nova Orleans. Os raptores em ação foi filmado entre Paris e Milão. A fuga para permitir-lhe matar é minha ideia.




SENTIERI SELVAGGI: Oliver Reed também era um ator difícil, certo?

SERGIO SOLLIMA: Reed era simpático, mesmo se estivesse completamente bêbado de vinho. Ele se permitia ser dirigido, mas a nossa relacão foi difícil porque ele estava alcoolizado. Os raptores em ação agradou muito Edmondo Amati, deveria ter estreado na Páscoa, mas acabou estreando em setembro, sem um lançamento promocional adequado.

SENTIERI SELVAGGI: Há algumas cenas de amor inusitadas!

SERGIO SOLLIMA: Certamente a cena de amor entre Reed e Agostina Belli, ou aquela entre uma Paola Pitagora muito hippie com Testi.

SENTIERI SELVAGGI: O cérebro do mal, por outro lado, não se assemelha a nenhum dos thrillers do período. Renato Cestiè é realmente perturbador.

SERGIO SOLLIMA: Nada é mais aterrorizante que as crianças. Era muito impressionante o fato de que ele fosse suspeito de matar seu pai. Aqui, como em outros filmes meus, há novamente a ambiguidade. Escrevi com um amigo como Luigi Emmanuele e, comparado aos meus outros projetos, realizei-o com bastante rapidez.

SENTIERI SELVAGGI: Você estava interessado na sobreposição entre a inocência e a culpa de Cestiè.

SERGIO SOLLIMA: Uma categoria figurativa inquietante. E Stefania Sandrelli tinha a ambiguidade correta. Voltei a trabalhar com Tino Buazzelli, que fez a minha primeira peça vencedora em Praga. Não é exatamente uma crítica social. Detesto as coisas sobre a mesa. Toda essa máquina infernal surge de uma posição de classe da nobreza. Cestiè é mantido em um internato e assim tem uma vida anormal. O filme teve a infelicidade comercial de sair no momento em que realizar um thriller significava facadas no ventre à Dario Argento.





SENTIERI SELVAGGI: Com aquela sua fixação pelo cuidado com as personagens.

SERGIO SOLLIMA: Sim, outra história de personagens. Mesmo se em um filme do gênero Buazzelli fosse curioso. As externas foram filmadas na Villa Visconti localizada no lago de Como.

SENTIERI SELVAGGI: Com Sandokan você alcançou o topo do sucesso.

SERGIO SOLLIMA: Tenho muita afeição por Sandokan. Na época, foi visto por 27,5 milhões de adultos. Eu o adaptei de Le tigri di Mompracem. Salgari é um escritor rico em qualidade. Você deveria ler seu ciclo do Oeste. Afinal, em 1905, quem diabos sabia como era feita a fronteira? Ele tinha uma seriedade do século XIX, documentando com grande seriedade este mundo tão distante de nós.

SENTIERI SELVAGGI: Conte-nos todos os bastidores desse triunfo.

SERGIO SOLLIMA: Alberto Silvestri e eu coletamos notas para um pré-argumento. Nós o reescrevemos todas as noites. Salgari devia ser lido e esquecido, pois tem uma condução narrativa irregular.

SENTIERI SELVAGGI: Quais são as diferenças entre a adaptação e o romance?

SERGIO SOLLIMA: No livro a história de amor entre o pirata e Marianna é apenas mencionada. Pense que, em prol do realismo, eu me senti em casa na Índia. Nino Bixio também morou na Malásia, mas não conhecia o dayak como Salgari.

SENTIERI SELVAGGI: Houve alguma interferência do produtor?

SERGIO SOLLIMA: Não, Goffredo Lombardo não interveio. Ele só reclamou do orçamento de um bilhão, mesmo não acreditando muito no projeto. Nós perdemos 100 milhões por causa da crise do petróleo, porém a R.A.I. queria fazê-lo por muito tempo. Foi uma obra muito desejada por Angelo Romanò, um homem de grande inteligência. Damiano Damiani, Duccio Tessari e Sergio Leone foram sondados para a direção. Houve uma primeira reunião de roteiristas, cujos nomes eu gostaria de não recordar. Finalmente, Tullio Kezich promoveu o meu nome para a direção. Entusiasmado com o projeto, li o primeiro roteiro, bastante irrealizável na realidade. Em pouco tempo apresentei uma nova escaleta onde eram mais caracterizadas personagens fascinantes como Yanez e Brooke. O último foi realmente uma personagem estranha. O livro das filmagens também foi editado.

SENTIERI SELVAGGI: Para o elenco e Kabir Bedi, como você se arranjou?

SERGIO SOLLIMA: Nós fizemos uma viagem para a Ásia. O casting seguia de mãos dadas com a busca por locações. Eu queria um malaio, pensei inicialmente em Toshirō Mifune. Imagine que encontrei o intérprete de Tremal Naik na cozinha do meu hotel. O belo é que Kabir apareceu justamente para interpretar Tremal Naik! O modo de se mover da personagem, no entanto, era mais real. Kabir era um sikh bastante rotundo. Então tivemos que escurecê-lo, pois os sikhs são mais claros. Ele perdeu uns cinco ou oito quilos em Roma. A mãe, inglesa, era uma freira hindu, enquanto seu pai era um guru. Eu percebi que a Malásia é um outro planeta e eu queria filmar em lugares reais, encontrar o Mompracem justo. De resto, Labuan era inglesa, de frente para o norte de Bornéu. Eu refiz as ilustrações dos livros. Nós tivemos um Leroy extraordinário. Ele me parecia certo para a personagem de Yanez, ele tinha uma classe instintiva. Até mesmo Carole André tinha uma classe crível. Ela tinha que ser realmente uma aristocrata. Adolfo Celi tinha uma personagem para desfrutar. Brooke era belíssimo e muito atormentado, como Peter O’Toole em Lawrence da Arábia (Lawrence of Arabia, David Lean, 1961-1962). Morreu sozinho na Inglaterra no meio de um nevoeiro. Renunciei a Helmut Griem por Celi.

SENTIERI SELVAGGI: E o efeito especial do combate no ar entre Kabir Bedi e o tigre que ameaçava Marianna.

SERGIO SOLLIMA: Eu inventei o primeiro efeito especial. Um dia filmei o salto do tigre na Índia, em outro dia a cena com o dublê em Londres. Depois liguei as duas sequências na montagem, combinando a barriga do animal com a faca empunhada pelo “Tigre da Malásia”. Você sabe que com o fundo azul se corrigem as imperfeições. Nós ainda trabalhamos em Londres, com os mesmos responsáveis pelos efeitos especiais para Superman: o filme (Superman, Richard Donner, 1977-1978). Sandokan não tinha que voar, tinha que simplesmente dar um salto. Vi atletas e mestres orientais saltarem a três metros de altura!

SENTIERI SELVAGGI: E o Sandokan da Mediaset?

SERGIO SOLLIMA: Lombardo não tinha mais nem Leroy nem eu. Então ele bloqueou o nosso Sandokan il ritorno para fazer Il ritorno di Sandokan (Enzo G. Castellari, 1995-1996). No entanto, o Sandokan original teve êxito em todo o mundo, no Japão, na Espanha e na Alemanha, onde foi devidamente promovido. E também lançaram a versão cinematográfica da adaptação.

A R.A.I. 2 queria levar ao cinema Sandokan, o tigre da Malásia. Aqui Sandokan permanece em retiro na Índia enquanto ocorre a revolta dos sipais. Eram soldados indianos que em 1860 se rebelaram contra a Companhia das Índias. Isso acabou sendo suprimido. O filme foi afetado pelas dificuldades. Também foi o último Sandokan para a R.A.I., e para economizar dinheiro fomos obrigados a filmá-lo no Sri Lanka.





SENTIERI SELVAGGI: Neste filme há a participação particular da personagem do grego, interpretada por Massimo Foschi.

SERGIO SOLLIMA: Foschi é um ex-revolucionário, um mercenário. Ele está corroído pela inveja, há um diálogo entre Celi e ele, que inveja Brooke visto que este começou do nada. Teresa Ann Savoy não era muito boa. Eu tive que usá-la porque Kabir e sua linda namorada, que desempenharia o papel, tiveram a bela ideia de se separarem.

SENTIERI SELVAGGI: Sandokan tornou-se um ponto sensível, falemos então de outro herói salgariano como O corsário negro.

SERGIO SOLLIMA: O corsário negro é uma personagem mais romântica e extraordinária. O filme foi rodado em Cartagena, uma cidade colombiana. Lá os espanhóis haviam construído uma barreira no porto para impedir a entrada dos navios corsários. Não fomos avisados e o rebocador o acertou em cheio, com o navio corsário tombando para um lado. A muralha foi feita com tapumes. O corsário negro não teve uma bilheteria tão boa, talvez porque tivesse um apelo muito televisivo. O produtor era da Cineriz, à época envolvida com a P2, uma loja maçônica. Portanto, ele estava falindo. Para os dois irmãos assassinados por Van Gould há o juramento fúnebre da personagem. Eu acho que Carole André estava grávida, enquanto Franco Fantasia era o diretor da segunda unidade. E havia também Sonja Jeannine, muito adequada para o papel da jovem índia.





SENTIERI SELVAGGI: Na sua vertente televisiva, I ragazzi di celluloide, no entanto, continua sendo o trabalho que você mais ama.

SERGIO SOLLIMA: Você realmente deveria vê-lo! Porque é uma história vagamente autobiográfica, ligada à minha geração. Um vislumbre da história da Itália! A série deveria ser uma trilogia: da Segunda Guerra Mundial até hoje. Durante o fascismo os jovens se apaixonavam pelo cinema para escapar daquela capa sufocante de imbecilidade. Os fatos datam de 1941. O cinema para nós era um sonho. No elenco havia Massimo Ranieri, que entra na Resistência e se apaixona por Roberta Paladini, Alfredo Pea, que na ficção gosta de homens e não de mulheres, Massimo De Rossi no papel de um estudante muito talentoso, e meu amado William Berger que já havia utilizado em Quando os brutos se defrontam no papel de um professor comunista. Havia também Leo Gullotta, que interpreta um judeu e está muito bom como sempre. A primeira série agradou muito, foi exibida no Festival de Cinema de Veneza e depois em Nice. Um ano se passou e a segunda série estreou em meados de agosto. O melhor elogio ao trabalho foi feito por Kezich: “De agora em diante você não será mais aquele que fez Sandokan, mas será aquele que fez I ragazzi di celluloide”.




(originalmente publicado em Sentieri selvaggi, 4 de agosto de 2004. Traduzido por Kevin Albuquerque)

 

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