A IDADE ADULTA DA ARTE
Sobre Amantes de James Gray, por Felipe Medeiros


(Two Lovers). 2008. 2929 Productions/Wild Bunch/Tempesta Films (110 minutos). Produção: Donna Gigliotti, James Gray, Anthony Katagas. Produção executiva: Todd Wagner, Mark Cuban, Marc Butan, Agnès Mentre. Co-produção: Mike Upton, Couper Samuelson. Roteiro: James Gray e Richard Menello. Fotografia: Joaquín Baca-Asay (Super 35, Technicolor). Cenografia: Happy Massee (p.d.), Peter Zumba, Marc Benacerraf (a.d.), Carol Silverman (s.d.). Montagem: John Axelrad. Elenco: Joaquin Phoenix (Leonard Kraditor), Gwyneth Paltrow (Michelle Rausch), Vinessa Shaw (Sandra Cohen), Isabella Rossellini (Ruth Kraditor), Elias Koteas (Ronald Blatt), Moni Moshonov (Reuben Kraditor), Bob Ari (Michael Cohen), Julie Budd (Carol Cohen), Iain J. Bopp (David Cohen), Anne Joyce (a ex-noiva de Leonard), Samantha Ivers (Stephanie), Jeanine Serralles (Dayna), Miguel Rivera (Antonio), Clinton C. Ingram (leão-de-chácara), Doug Wright (maître), David Ross (garçom), David Cale (joalheiro), Shiran Nicholson (DJ Juice), Marion McCorry (recepcionista), Saidah Arrika (enfermeira).

Há, entre outras razões que nos forçam a escrever sobre Amantes, uma tendência um tanto quanto arbitrária que se alardeou na crítica cinematográfica. Aqueles que freqüentemente apontam James Gray como um mero artesão competente são os mesmos que insistem numa suposta “evolução” da arte do cinema, sem deixar claro a qual aspecto essa evolução se refere especificamente: se de sua técnica, de suas formas ou de suas estruturas econômicas. E, assim, anunciam sem questionamento as “etapas do cinema” como se estivessem vendendo peixes numa manhã de domingo em pleno mercado público: Classicismo (gênese), Modernismo (apogeu) e Maneirismo (decadência).

O anacronismo disso tudo é que tal estrutura histórica convém muito mais às outras artes. Na pintura, por exemplo, onde verificamos mudanças essenciais - de Giotto a Massaccio, de Massaccio a Da Vinci, de Da Vinci a Bosch, de Bosch a Millet - e no Teatro, a partir da consciência cênica dos rituais que fundam a representação. O cinema trai essa concepção tradicional da arte: suscetível de progresso, é a única arte imediatamente moderna, e os únicos traços de sua evolução manifestam-se principalmente nas obras em que a aplicação sensível e imediata dos avanços tecnológicos alia habilmente um procedimento mecânico a uma sensibilidade, um temperamento, uma propensão (pensemos no zoom nas mãos de Rossellini, no CinemaScope em Preminger e Ray, na cor em DeMille e Minnelli, no som em Renoir e Lang).

Ora, desde o começo do sonoro, os grandes cineastas souberam utilizar a dinâmica rítmica e dramática da fala - do som - para sedimentar uma unidade visual que diverge da variedade plástica e pictórica do mudo. Se a imagem perdeu a precedência do escultural, fonte de fascinação apolínea, ela adquiriu uma flexibilidade que ampliou consideravelmente seus campos.

Das agitações e conturbações pictóricas do cinema dos anos 20, essa modernidade se civiliza durante os anos 30 no teatro aristocrático de Lubitsch, Cukor e Guitry (ou, numa outra chave, Ophüls e Grémillon), no teatro rural de Renoir, Pagnol e Ford, no teatro dos bons sentimentos de Borzage e McCarey ou ainda no vaudeville selvagem dos filmes de gângster (Scarface - A Vergonha de uma Nação, Heróis Esquecidos) e o cabaré dos universos lascivos da espionagem e da contravenção (do qual von Sternberg permanece o mestre absoluto). Nessa época particularmente conturbada, os filmes - quer fossem peças históricas como as de Ford, DeMille e Guitry ou reportagens angustiantes como as de Hawks e Walsh - se compunham como retratos em que as cenas e os fatos se viam sustentados pelo encadeamento ensandecido de uma exaustiva documentação fotográfica. A inquietação característica dos cineastas dessa década fez com que os filmes, de M, o Vampiro de Düsseldorf a Alexandre Nevsky, averiguassem e indagassem incessantemente a montagem como procedimento de construção de sentido.

Com a mudança que ocorre rapidamente no fim da década, com filmes como A Regra do Jogo e Conto dos Crisântemos Tardios, o teatro falado dos anos 30 se sensibiliza e fornece assim as bases para um teatro mais amplo, mais generoso, que conhece nos anos 40 um ponto de equilíbrio ainda hoje insuperado, com filmes como Sob o Signo de Capricórnio, As Damas do Bois de Boulogne, O Fantasma Apaixonado, Sua Única Saída, Alemanha Ano Zero, Dias de Ira e Os Sapatinhos Vermelhos. Espantosa depuração da produção de um período que, contrariamente a qualquer classicismo artístico, acelerou-se, graças a cineastas como Nicholas Ray, Samuel Fuller, Elia Kazan e Budd Boetticher, rumo a pesquisas resolutamente vanguardistas. As invenções rítmicas de Fuller, Welles e Aldrich e a depuração teatral em Losey, Gerd Oswald e Mizoguchi (anos 50) serão prolongadas nos anos 60 por cineastas como Godard e John Boorman no primeiro caso e Jacques Rivette, Eric Rohmer, Marguerite Duras, Rainer Werner Fassbinder, João César Monteiro e o casal Straub-Huillet no caso definitivamente mais fértil, o que não significa dizer menos laborioso, do trabalho sobre a duração do plano cinematográfico (que data concretamente dos irmãos Lumière), o qual se refugia mais e mais no campo da experimentação teatral.

O cinema é nada mais que a maioridade da arte, de todas as artes, justamente por ter sido no momento histórico e pelas circunstâncias de sua invenção a idade adulta das artes e também porque teve o desenvolvimento, justamente, de uma maturidade, evoluindo apenas na medida em que se ajustou à sua matéria.

Do Classicismo

James Gray nos parece a expressão mais bem acabada dessa maioridade nos dias atuais. Seu cinema, de maneira alguma regressivo, parte na realidade de uma dialética fundamental: de uma forma de arte primordial em que o indivíduo é relacionado ao todo, o cineasta percorre a narrativa a partir da ótica mais ampla, fundadora da reciprocidade entre o ser e seus horizontes. Estamos longe de uma ambientação que presta contas a respeito do que realmente acontece na trama: a “épica” do indivíduo, a “história” da narrativa e suas diferentes formas de temporalidade são todas submetidas a um equilíbrio classicista, que mantém intacta a força da cena ao mesmo tempo em que sustenta seus prolongamentos menos harmônicos. A dialética de Gray: seu compromisso com um classicismo formal não chega a sufocar a aventura, a hermenêutica, na medida em que não há a recusa do desequilíbrio e da desmesura. Eis o que até agora o permitiu filmar as jornadas de Joshua, Leo, Bobby e Leonard. É essa a diferença, crucial, entre o arejamento do classicismo e a rigidez acadêmica, que se concentra no engessamento da forma como uma maneira de garantir os mesmos significados (permanentes) dos conteúdos.

Da pornografia

O cinema, devido à potência técnica do seu olhar, possui em sua essência uma vocação pornográfica que os grandes artistas tentam a todo custo controlar, equilibrar, medir, perverter. O que é a pornografia? É este olhar que tudo vê, que tudo abarca, do infinitamente pequeno ao infinitamente grande, do cosmo à formiga. Pela primeira vez, todos os tabus ontológicos e religiosos foram não apenas desrespeitados mas simplesmente violados, penetrados, “mostrados a fundo”: o sexo, os cadáveres, o sagrado. O homem até então nunca se tinha visto de tão perto (e de tão longe), ao menos não com essa exatidão ontológica, esta infalibilidade na reprodução do tempo e do espaço da presença. Um olhar sem limites, informe e caótico, algo contrário a toda representação (artística ou não).

O olhar pornô não se nega a ver nada, e apesar de onívoro, é um olhar que não “vê” propriamente (seus últimos avatares, Bastardos Inglórios e I’m Not There, refletem nada mais que a miopia da crítica que os exaltou). Porque para ver (dar a ver) é preciso que a coisa esteja a princípio oculta, opaca. O olhar da arte é um olhar diferente, “outro”, sobre o real - um olhar perverso no sentido em que modifica os seus fins: fazer sexo para procriar é “normal”; fazer sexo por amor ou por prazer não deixa de ser perverso no sentido que imprime ao ato sexual fins (objetivos) contrários aos determinados pela cultura. A arte no cinema surge, portanto, dessa necessidade de contrabalançar e, até certo ponto, assimilar e reprocessar essa vocação primeira pornográfica. Assim, o cinema como arte é esta física, esta contenda entre mostrar e não mostrar, entre o olhar pornográfico que a técnica permite e o olhar ontológico e histórico que a arte instaura.

O teatro possível

Ao lado de Pedro Costa, Eugène Green, Clint Eastwood e Jean-Claude Brisseau, James Gray compõe a margem dos poucos cineastas contemporâneos que realmente estão realizando algo novo, ou propriamente moderno, por passarem ao largo das convenções mais ordinárias do cinema e estabelecerem uma dialética inteiramente livre e potente a partir unicamente da disposição e da proximidade das personagens, dos objetos e o pano de fundo sem o qual não há representação. Unicamente, em outras palavras, pela mise en scène.

O classicismo no cinema seria uma última etapa de evolução do antigo teatro. A amplitude da representação teatral se revelou apta à passagem para o aparato técnico que há no cinema. As distâncias entre a câmera, o ator e a cena se completam no ritmo, pois imprimem e organizam a força e direcionam o tom da representação, e não o contrário, como se vê no velho teatro, onde as modulações e os gestos atuam na dilatação da ação em função do espectador e da própria limitação cênica do palco teatral.

O caso de James Gray é fascinante: é como se ele ultrapassasse essa última etapa da dramaturgia clássica para apontar um caminho ainda não tão explorado como fora pelos japoneses, ou por Pialat e Gérard Blain na França, Comencini, Olmi e Zurlini na Itália e nos Estados Unidos por Ray, Cimino e Cassavetes. Revelando-se pela nudez, o classicismo se converte na própria atmosfera do filme. Alcança-se o esplendor da presença que caracteriza tão bem as obras clássicas, mas a mise en scène já não se organiza mais pelo gesto: as nuances e as complexidades das personagens ultrapassam a forma como o filme busca sintetizá-las através de gestos e ações.

Um acontecimento se dá pontualmente e “a cada vez”, como se um trecho do mundo se isolasse do resto com o intento de representá-lo, de figurá-lo. Nesta figuração do todo pela soma das partes, do infinitesimal ao acontecimento singular, expõe-se uma moralidade própria expressa pela exaltação do particular. Aqui, o gesto enquanto gesto descobre coisas que mudam o rumo da narrativa ou simplesmente a conduzem a novas rotas; o gesto surge um pouco como em Rossellini, na retomada do numinoso do conhecimento, seu pathos espiritual, o fato de que antes de tudo ele é um tatear e um descobrir, uma experiência tátil e visual do mundo.

Na cena de despedida da mãe em Amantes, por exemplo, algo se cristaliza: Phoenix é tocado pela escuta, algo feminino, afetivo, mais furtivo e, portanto, menos tocado pela visão apolínea, na medida em que esta se constitui no concreto das imagens e dos gestos. As personagens são sempre maiores que aquilo que os gestos pareciam indicar, o que confere fluidez e densidade às particularidades do drama, visto que há um método muito elaborado e sensível (talvez até bastante pessoal) de direção da fala do ator (Gray, como Tourneur, faz com que os intérpretes murmurem seus textos) e de sua gestualidade (somente o trabalho de Edward Furlong em Fuga para Odessa, da forma como o ator segura um cigarro à curvatura dos seus ombros nas cenas em que erra pelas ruas, a pé ou de bicicleta, mereceria uma dissertação). A questão toda aqui encontra-se na substituição da Lei do gesto e do enquadramento, que revelam como guias e julgam como moralistas, pela restituição ao cinema do pathos, do ímpeto numinoso das errâncias rossellinianas, do Bildungsroman e do bigger than life americano dos anos 50.

Poética da materialidade

Falávamos de classicismo: artesanato, poiésis, recriação material do mundo espiritual. A atuação de um desejo como ânsia da expressão. O desejo necessita de suportes, superfícies, objetos para se projetar. O desejo se inscreve, ele é um rastro, uma linha, uma linguagem. Sobre o que ele se inscreve? Sobre corpos, superfícies, compostos espaciais e temporais.

A materialidade é no cinema uma ciência (e uma ontologia, e uma didática, e uma teleologia) do desejo, da ânsia de expressão. Há evidentemente um cálculo, mas maleável, plástico, que serve sobretudo para consolidar a independência do objeto sem precisar destruí-lo. A questão toda é esta, de representação, pois se tudo permanecesse na esfera do mental, se não se projetasse na matéria, simplesmente “não haveria”, não viria a ser. Essa foi a inteligência do classicismo: ver que a matéria é o suporte do espírito e o espírito o princípio plástico de “coação” da matéria. Mas para isso, convém assinalar entre parênteses (e isso é o que faz toda diferença), é necessário usar três corpos, três unidades contingentes e presentes, três compostos, feitos de tempo, espaço e afetos. Eis a matéria através da qual o homem conduz a sua arte, através da qual um cineasta realiza a mise en scène - luz, espaço, tempo e o ar em torno de tudo isso.

Quantos diretores em atividade fazem que o espaço vital do ator, telúrico da paisagem, anímico da atuação, geográfico da região, geométrico da composição encontrem-se com tamanha precisão e tão poucos cortes como o que Gray nos dá a ver durante o acerto de contas entre Joshua e seu pai no trigal em Fuga para Odessa, a transformação de Willie em um Othello tomado pelo ciúme cego em Caminho Sem Volta, a condecoração solitária de Bobby em Os Donos da Noite ou o apanhar de luvas atiradas ao mar por Leonard em Amantes?

Inverno em Brighton Beach

As paisagens em Amantes correspondem a pontos de vista que, jamais totalmente unificados ou articulados, acabam por nos dar a seqüência de pontos diferenciais a partir dos quais um mundo revela toda a sua translúcida intensidade - dramática, pictórica, cognitiva. As associações sentimentais se expressam numa modulação muitas vezes simples de interpretação dos atores, onde o espaço, o tempo, a percepção centralizada e centralizadora que neles se ancora nos dá a percepção do mundo como uma instância única e absoluta, que se realiza integralmente na fulminação do plano - e que eles se asseguram de fixar e reter.

O filme repercute uma personalidade estreita a do pintor Edward Hopper. Um clima entre a leve resignação e o alheamento ao mundo exterior - prático, objetivo e solitário em sua prosperidade. Ao contrário das personagens de Hopper, das quais supomos pela emanação de uma luz evanescente que esperam qualquer coisa acontecer com a certeza da frustração, irredutíveis em seu isolamento, as de Gray se lançam ao mundo sensível. Essas personagens são fundadas sobre hesitações, sobre inspirações e aspirações que insuflam uma percepção que se situa fora do tempo, não por negar a sua época, mas justamente pelo contrário: por aprofundar os momentos de intimidade e idiossincrasias das personagens, por interiorizá-los para que penetremos em suas almas, por reconstituir a vida ordinária sob um ângulo extraordinário - ângulo que enfatiza a ordem do atual e revela em seu cerne todo um complexo de símbolos e palavras por completar, de rastros que devem permanecer velados e indecifráveis, presentes sem mais.

Privilegia-se uma decupagem em que menos se acumula eventos do que se acumula impressões. Daí a desorientação, os fulgores, a Paixão sem estações. O filme não existe sem a presença de Leonard. É um olhar intersticial, por onde todas as relações, secretas e manifestas, se não aparecem totalmente, permitem-se ao menos um relance, já que, se o jogo fosse desmascarado, não seria um “jogo”. O jogo que joga Leonard é o da projeção de correspondências. Ele não se deixa convencer que a mulher que ama talvez não seja a sua mulher idealizada. Há sempre a impressão de que há uma última cartada ou uma última chance que vai, no último momento, restituir o ciclo/circuito deste jogo.

E neste jogo da paixão surge o lirismo, transfigurado num documento sobre a Graça. Transfiguração da realidade que nasce do encontro do homem apaixonado com o cosmo à sua volta; o homem sorri, e tudo sorri com ele. Contudo, Gray também explora a atmosfera de banalidade do “sonho acordado” nas expressões das personagens - tanto em Leonard como na personagem de Michelle, sempre indecisa quanto aos seus planos futuros com o namorado - para instaurar mistérios, sugestões, incertezas e a antecipação de um ato que pode ser decisivo e mudar toda a trama.

Desta contemplação “ordinária” da realidade sendo mudada (no melhor sentido: casual, transitiva, porém precisa, pontual), os planos finais de Amantes fornecem um tratado sucinto sobre como o classicismo no cinema é capaz de representar o mundo interior sem que para isso as formas do mundo sensível acabem traídas, representando o mundo realmente como nós o vemos hoje. O autor apaga-se a si mesmo, mas sua ausência não suprime a perspectiva moral que orientou sua criação, e assim somos deixados apenas com a pura exaltação da atmosfera, do espaço e do tempo que fundam um mundo.

A mise en scène já não é a fonte absoluta de informação e significação do real para atingir a verdadeira percepção objetiva, que se encontra mais ao nível da pele e das circunstâncias que apesar delas. Ela nada mais é que uma técnica que se reapropria dos conteúdos do mundo e lhes imprime um sentimento; ela não deixa de ser dependente, situada no mundo, mas ela confere a essa situação, a esta “anterioridade do mundo” um sentido que o mundo nunca teve. Cinema moderno, enfim.

“Calmo bloco caído aqui de um desastre obscuro,
Que esse granito oculte ao menos seu contorno”


Não há final mais triste e discreto no cinema dos últimos anos que o apanhar de luvas solitário de Leonard em pleno réveillon, quando a “nostalgia do Éden” se converte numa aceitação do sacrifício como destino daqueles que não podem retornar à origem sem se destruir.

Se isso acontece, como foi dito a certa altura no texto, é devido à capacidade de Gray de converter em fluidez a densidade das particularidades do drama. Há em Amantes essa capacidade de alinhar a biografia completa de uma personagem através de uma simples aparição, profundamente devedora da mais rica herança do cinema clássico. A repercussão dos gestos enobrece ao invés de vulgarizar os aspectos psicológicos (como no melhor de Visconti e Losey), e muitos desses gestos instituem às ações precedentes uma aura de mistério, ampliando-as num generoso raio de significação. Há no trabalho de Gray um simples e, ao mesmo tempo, complexo modo de fundamentar os aspectos psicológicos da cena por um traçado verdadeiramente muscular da expressão, particularmente visível nas feições de Vinessa Shaw. Ao invés de desenvolver um recito pontual sobre os episódios narrativos, James Gray nos conduz através de atmosferas, estados de alma e percepções.

James Gray deflagrou em Fuga para Odessa, Caminho Sem Volta, Os Donos da Noite e Amantes o classicismo da jornada da contemplação, do acúmulo ou do desanuvio de uma atmosfera. De uma atitude em que o rigor e a recusa se confundem e levam o cineasta à ruptura com a época corrente decorre um inevitável isolamento, que permanece para nós formidavelmente precioso.


 

VOLTAR AO ÍNDICE

 

 

2011 – Foco