THOMAS CROWN - A ARTE DO CRIME, John McTiernan, 1999
por Jacques Vallée


Um milionário organiza e sucede o roubo de um quadro de mestre no Metropolitan Museum. Uma caçadora de recompensas particularmente atraente é contratada pela companhia de seguros para encontrar o ladrão...

Esta refilmagem do pseudo-clássico com Steve McQueen e Faye Dunaway é amplamente superior ao original. Em primeiro lugar, a mise en scène de McTiernan excede claramente a de Norman Jewison. Nada de split-screen brumoso nem de simbolismo ridículo aqui. O estilo do filme de 1999 é à imagem do seu tema: um jogo de sedução. O cineasta não hesita em ampliar os detalhes provocantes (ha, a introdução da personagem de Rene Russo através de um dolly nas suas pernas, usando cinta-liga e espartilho!). Ele mantém a distância correta daquele que é consciente da vulgaridade do seu material e que aposta nela. É a elegância segundo John McTiernan, o homem que realizou autênticas obras-primas de inteligência filmando Bruce Willis e Arnold Schwarzenegger dizimando terroristas. Os desacertos associados a algumas inegáveis falhas de gosto (alguns planos óbvios, alguns temas musicais estridentes) são insignificantes diante do prazer de se ver absorvido pela fluidez excepcional da mise en scène e por uma intriga diabolicamente manipuladora.

No entanto, o interesse da obra não se limita ao virtuosismo de um metteur en scène performático. Se fosse esse o caso, Thomas Crown - A Arte do Crime seria um filme espertinho, divertido mas inútil. Ora, é um grandessíssimo filme, um dos melhores dos anos 90. Isso porque a prestidigitação roteirística não é uma mecânica separada do resto, pois exprime uma parte da verdade dos personagens; a saber: suas inteligências supremas.

Entre as linhas de sua história de quadro roubado, McTiernan retraça as relações de dois brilhantes quarentões, ainda atraentes porém conscientes que se trata provavelmente da última chance de não terminarem suas vidas sozinhos. É tão discreto quanto comovente, à imagem desse plano que não dura mais do que dez segundos em que Rene Russo desce as escadas em lágrimas após ter surpreendido seu amante com uma jovem mulher. É o próprio filme que descarrila, a verdade que rebenta sob o pretexto do jogo de sedução, a emoção inesperada. E é ainda mais genial que, mais tarde, a narrativa integrará essa peripécia sentimental ao seu programa lúdico. A fusão é perfeita entre o enredo perfeitamente escorregadio e as trajetórias emocionais dos personagens sem que em momento algum os segundos pareçam assujeitados ao primeiro.

De alguma forma, Thomas Crown - A Arte do Crime é uma história de amor na tradição de Tarde Demais Para Esquecer. Como o casal de libertinos na obra-prima de Leo McCarey, os heróis de McTiernan devem aprender a baixar suas guardas, a renunciar alguns prazeres materiais para provar sua fé no outro. Evidentemente, todo esse discurso sobre a maturidade é tão mais verdadeiro porque os atores são excelentes. Expressando a segurança vulgar da caçadora de homens tão bem quanto a instabilidade daquela que sabe da iminência do outono de sua vida, Rene Russo encarna maravilhosamente o que permanece até hoje seu melhor papel. Ela está resplandecente e é pouco dizer que o cartaz photoshopado não faz justiça à sua beleza.

Em suma, Thomas Crown - A Arte do Crime é uma jóia que parece ressurgir de uma concepção esquecida do cinema: a do cinema de autor hollywoodiano como defendiam os cinéfilos dos anos 50. Isso quer dizer uma arte de usina na qual o realizador injeta preocupações pessoais ao mesmo tempo em que se conforma brilhantemente aos protocolos do estúdio. Um cinema modesto mas extremamente agradável e mais profundamente singular que o dos demiurgos aos efeitos de assinatura abonados dos festivais.

(originalmente publicado no blog Avis sur des films [em http://films.nonutc.fr/2010/05/13/thomas-crown-john-mctiernan-1999/], mantido pelo próprio autor. Traduzido por Bruno Andrade)


 

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