MEU PAI, ETERNO AMIGO, Paul Newman, 1984
por Jacques Vallée


Um operário da construção civil não recuperado do falecimento de sua esposa convive com dificuldades com um filho que deseja se tornar escritor.

Como em Rachel, Rachel e O Preço da Solidão, os personagens são vistos com um respeito, uma exatidão e uma ausência de ornamentos, o quê fornece uma pungente impressão de captação da verdade humana. Talvez o segredo de Newman realizador seja tão simples quanto possa parecer seu filme. Ele jamais parece subordinado a qualquer efeito, a qualquer programa, a qualquer discurso ou mesmo a qualquer narrativa. Isso que tem por efeito desestimular a interpretação pode enganar o espectador desatento que irá rapidamente assimilá-lo a um vazio cinematográfico. Ora, se Paul Newman é um dos maiores cineastas da segunda metade do século XX, é que, centrando-se quase que exclusivamente sobre os homens e as mulheres que filma, ele atinge milagres de mise en scène.

Tomem por exemplo o momento em que Harry recebe sua filha e seu genro. Não vou lhes contar em detalhes para não estragar o prazer duma eventual descoberta e porque apresentar as múltiplas questões dessa seqüência seria longo e fastidioso. Saibam simplesmente que há aqui uma idéia de gênio que se chamará idéia do papelão. Por que a idéia do papelão é uma idéia de gênio? É porque ela faz passar, num piscar de olhos, o espectador do riso às lágrimas, da cumplicidade à piedade para com Harry, em resumo porque ela condensa e restitui com uma emocionante evidência a complexidade do personagem. De momentos como esse o filme é repleto. Momentos que me fazem dizer que Meu Pai, Eterno Amigo é um dos mais belos filmes jamais feitos sobre o amor filial.

Deve-se dizer que Newman realizador é aqui ajudado por Newman ator e que Newman ator nunca pôde talvez ser tão bom. Sem a menor afetação, ele exprime toda a fragilidade de seu personagem, secretamente minado pela amargura e pela fragilidade. Ajudado por seu filho, não obstante ele obtém ao final do filme uma dignidade que nos lembra que Paul Newman, mesmo quando desapegado do ouropel do seu mito, é decididamente a classe em estado puro. No mais, sua esposa Joanne Woodward tem aqui apenas um papel secundário, mas as cenas deles juntos liberam uma emoção, provocam uma extraordinária empatia e elas bastariam para tornar Meu Pai, Eterno Amigo infinitamente precioso.

(originalmente publicado no blog Avis sur des films [em http://films.nonutc.fr/2009/07/26/laffrontement-harry-and-son-paul-newman-1982/], mantido pelo próprio autor. Traduzido por Matheus Cartaxo Domingues)


 

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